O
doze de outubro era um dia de farra em minha rua. Enquanto umas crianças corriam
pelo passeio do fórum, rebocando seus carrinhos ou acalentando bonecas, outras
chutavam bolas coloridas no jardim das algarobas. Dona Tereza, vendedora de
doces e gudes, quase não conseguia atender a tantos miúdos na janela de sua
casa. Inclusive eu, que sempre ganhei presente no dia das crianças. Meus pais se esforçavam para comprar algum brinquedo, mesmo simples. Em 95, ganhei
um tanque de guerra movido a quatro pilhas de um tamanho tão especial que meu
pai não achou para comprar. Com o motor desligado, as esteiras, por onde deveriam correr as rodas, não se
mexiam. Nem para trás, nem para frente. Triste, com os olhos inundados, fiquei
lá admirando o caminhão-estátua. Foi quando um amigo meu chegou. Ele sempre ia
lá em casa puxando seu carrinho da polícia.
—
Tu ganhou esse tanque de guerra?! — perguntou o amigo fazendo festa.
—
Foi, mas não anda não. Painho não achou a bateria dele.
—
Tem nada não, dá para brincar com ele parado!
—
Tu também ganhou um carro?
—
Já tenho um carro, ganhei no ano passado.
Olhei
para o carrinho da polícia numa ponta do barbante. Na outra ponta, havia um
menino de pés descalços e enlameado dos pés à cabeça, vibrando com o mesmo tanque de guerra pelo
qual eu chorei. Não lembro o que senti naquele momento. Vergonha, eu acho. Enquanto
eu ganhava um presente diferente a cada dia das crianças (aniversário e Natal),
meu amigo ganhava o mesmo todo ano. Quantas crianças da minha rua não
ganhavam nem isso e estavam lá no passeio puxando caixas de sapato? Todo mundo feliz da vida.
—
Bora brincar lá fora? Tá todo mundo lá.
—
Bora!
Meus
olhos secaram e eu fui brincar na rua. Só voltei no final da noite, de pés descalços e enlameado dos
pés à cabeça.
Da série Chapolim, episódio: O menino que jogava fora seus brinquedos |
3 comentários:
Maravilha!!!!
Obrigado, Wileyde.
Abraço!
Obrigado, Wileyde.
Abraço!
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